A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, nesta terça-feira (10), a fase de interrogatórios no processo que apura a tentativa de golpe de Estado para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após as eleições de 2022. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete aliados foram ouvidos como parte do chamado núcleo duro da suposta trama golpista.
Os depoimentos ocorreram entre segunda (9) e terça-feira (10) e foram presididos pelo ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal 2668. Os réus responderam às perguntas feitas por Moraes, pelo ministro Luiz Fux, pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, e pelos advogados das defesas.
Todos os acusados negaram participação em qualquer plano de golpe e contestaram as acusações da Procuradoria-Geral da República (PGR). “Com isso, encerramos todos os interrogatórios. Declaro encerrada a audiência de instrução da AP 2668”, afirmou Moraes ao final da sessão.
O ministro também informou que acusação e defesa terão cinco dias para solicitar eventuais esclarecimentos. Em seguida, serão intimadas a apresentar as alegações finais. Nessa fase, os advogados ainda poderão pedir novas diligências, que serão avaliadas pelo relator.
A decisão sobre uma possível prisão ou absolvição dos réus só será tomada após essa etapa, com o julgamento pela Primeira Turma do STF. Como a Corte entra em recesso em julho, a análise do caso deve ocorrer apenas a partir de agosto.
Bolsonaro foi ouvido por cerca de duas horas e meia. A sessão teve um tom cordial e, em alguns momentos, descontraído. O ex-presidente negou qualquer conversa sobre golpe com comandantes das Forças Armadas e afirmou que tudo o que foi discutido após as eleições de 2022 estava “dentro da Constituição”.
Segundo Bolsonaro, foram realizadas reuniões sobre a possibilidade de decretação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), diante do risco de paralisações de caminhoneiros e manifestações em frente aos quartéis.
“Tratamos de GLO porque os caminhoneiros estavam na iminência de parar. Estudamos possibilidades, todas dentro da Constituição”, disse. Ele também afirmou que houve quem sugerisse decretar estado de sítio, mas que essa ideia não foi levada adiante.
Sobre a minuta de decreto golpista encontrada pela Polícia Federal, Bolsonaro confirmou que o tema foi discutido com comandantes militares, mas negou ter redigido ou alterado o texto. “Não escrevi, não alterei, não digitei nada. Não tenho responsabilidade sobre essa minuta”, declarou.
Em relação às urnas eletrônicas, o ex-presidente manteve sua posição em defesa do voto impresso e disse que suas declarações foram críticas e não ataques ao sistema eleitoral. Ele apresentou falas de parlamentares da esquerda e do ministro Flávio Dino em que também se questionava o processo eleitoral, como forma de justificar seu posicionamento.
Durante o depoimento, Bolsonaro pediu desculpas a Moraes por tê-lo acusado de receber propina para acobertar fraudes nas eleições. “Não tenho indício nenhum. Foi um desabafo, uma retórica. Me desculpe”, afirmou.
O ex-presidente também afirmou que não passou a faixa presidencial a Lula para evitar uma “vaia histórica”. Em tom de brincadeira, chegou a convidar Moraes para ser seu vice em 2026 e mencionou uma viagem ao Rio Grande do Norte, perguntando se o ministro gostaria de receber fotos da visita. Moraes recusou com um “declino”.
Entre os outros sete réus do núcleo 1 estão aliados próximos e ex-integrantes do governo Bolsonaro:
– Alexandre Ramagem: acusado de promover desinformação sobre o sistema eleitoral enquanto dirigia a Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
– Almir Garnier Santos: ex-comandante da Marinha, teria colocado tropas à disposição de um golpe;
– Anderson Torres: ex-ministro da Justiça, guardava em casa uma minuta do decreto golpista;
– Augusto Heleno: general e ex-ministro do GSI, teria participado de ações para desacreditar as urnas eletrônicas;
– Mauro Cid: ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, delator no caso, relatou reuniões e trocas de mensagens sobre o plano;
– Paulo Sérgio Nogueira: ex-ministro da Defesa, teria apresentado decreto para criação de “Comissão de Regularidade Eleitoral”;
– Walter Braga Netto: único preso entre os oito, é acusado de financiar ações golpistas, incluindo plano para matar Moraes.
Segundo a PGR, os réus respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
A análise do caso agora depende da conclusão das etapas processuais e da retomada dos trabalhos no STF após o recesso. Até lá, não haverá decisão sobre condenações ou absolvições.